sexta-feira, 22 de maio de 2009

Dilma para poucos

Ana Dubeux - Correio Braziliense

anadubeux.df@diariosassociados.com.br






Há muitas formas de se enfrentar um diagnóstico de câncer. Normalmente, as pessoas escolhem uma e seguem em frente. Algumas se deprimem, outras lutam bravamente. A ministra Dilma Rousseff fez obviamente a segunda opção. Mas, no caso específico dela, o périplo a seguir já começou mais longo, antes do momento em que decidiu tornar pública sua condição de paciente de câncer. As consequências dessa declaração, que variam das imensas manifestações de apoio e solidariedade às mais imbecis tentativas de espetacularizar o caso, não foram exatamente as maiores preocupação da ministra. Ainda que muitos tenham certeza de que seu maior ato de coragem foi ali, diante das câmeras e microfones, ao lado de médicos e assessores. Antes de ser obrigada (para não se tornar vítima de especulações criminosas) a transformar sua doença num boletim médico, Dilma precisou olhar-se no espelho e reconhecer na mulher, que está no auge da carreira política e em ótima forma física, uma paciente de câncer. E isso inclui encarar o estigma cruel da doença. Precisou também contar para a mãe, Dilma, e para a filha, Paula. Exatamente este foi o momento mais delicado de todo o processo, como ela disse a mim e ao repórter Daniel Pereira na última sexta-feira, quando nos recebeu para a entrevista que você lê hoje aqui no Correio. Por mais que a olhemos como a pré-candidata à Presidência da República agora vitimada por um linfoma, com tudo o que isso representa, Dilma se vê como Dilma, com tudo o que ela é. Jornalistas em geral têm a pretensão de atribuir escalas de valores aos sentimentos humanos. Até corro esse risco, mas não posso me abster das minhas impressões pessoais do encontro com a ministra. Dilma ri muito, o que contraria o senso comum — ou a imagem imediata que você tem da ministra é de uma pessoa alegre e sorridente? Sim, ela é bem-humorada, muito embora não seja sempre assim e se reserve o direito de ser dura no trabalho. É uma característica pessoal dela, como deve ser de muitos outros políticos, mas se fala muito pouco ou quase nada dos humores, das barrigas e dos botox masculinos — e isso é um fato indiscutível. Por que razão o fato de ser durona virou a característica predominante de Dilma, é pergunta a ser feita às fontes jornalísticas, que muitas vezes ajudam a forjar um todo pela parte. E então a meia-verdade passa a ser absoluta. Engraçado então que toda essa pseudoaparência se desfaça nos poucos minutos de uma conversa sobre temas da vida cotidiana, como a maternidade, por exemplo. Dilma se emociona ao falar da mãe, da filha e dos filhos que queria ter tido e não teve; endurece ao lembrar da ditadura e tortura e ri diante das incompreensões diversas a respeito de ser mulher no mundo da política ou de ser política num mundo machista, tanto faz. A ministra, de fato, é uma pessoa envolvente. O que me impressionou nela, no entanto, não é a tranquilidade com a qual demonstra ter enfrentado um câncer publicamente, mas o fato de ser fiel ao espírito que a conduziu até aqui, mesmo diante da vulnerabilidade do momento. Ela continua a ser uma mulher sem meios-termos, como já nos conta sua biografia. Por isso, quando ela me disse que vai vencer o câncer, eu acreditei.

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